sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Apartheid

Aqui está ela e lá está ele.
Onde havia um ar terno e de afeto mora agora qualquer coisa feita de saudade
Não há mais os dois, nem os cheiros, nem os gestos, nem as taças vazias e depois um emaranhado de lençóis.

Aqui está ela e lá, sabe se aonde é lá, está ele.
Talvez ambos assoviem a mesma música, talvez remoam as últimas palavras ditas e aquelas outras que os olhos marejados não deixaram dizer.
Quem sabe um dos dois já se sinta melhor, aliviado.
Quem sabe nenhum...

Aqui está ela, possivelmente tentando convencer a si mesma de que não tinha escolha, de que o caminho sempre foi esse, de um futuro feito de fim.
Aonde ele está pode ser que esteja também o arrependimento por ter vivido essa história, por ter prolongado, por não ter sido casual...
E pode ser que estejam os dois questionando a vida, os céus, Deus, pelo desencontro.

Lá onde ele vive, deve ser calmaria.
Dentro dela é sempre turbilhão.
Lá onde ele vive não deve ser de queimar.
Com ela é sempre quente.
La onde ele vive é seguro, é dele.
Com ela tudo é dúvida, desconhecido.
E é lá que ele finca os pés, longe dela.

Aqui onde ela está, tudo é novo.
Ele é uma descoberta.
Aqui onde ela está tudo é feito de palavras.
Com ele, vira música.
Aqui onde ela está é pra ontem, é pra já.
Com ele tudo tem três tempos, tem estágios.
E é aqui, longe dele, que ela está.

Não há mais os dois, nem os cheiros, nem os gestos, nem as taças vazias e depois um emaranhado de lençóis.
Onde havia um ar terno e de afeto mora agora qualquer coisa feita de saudade.
Aqui está ela e lá está ele.

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